Além de lesões no cérebro de bebês, o vírus zika pode estar provocando também problemas no cérebro de adultos. É o que desconfia um grupo de cientistas do Rio, que iniciou um projeto de pesquisa no começo da semana para investigar casos de encefalite (inflamação do cérebro) e de encefalomielite (inflamação também na medula espinhal) que vêm chegando aos hospitais do Estado em pacientes que também relataram sintomas de zika.
Os casos que estão sendo investigados chamam a atenção diante de uma revelação feita na semana passada, quando foi noticiado o sequenciamento do genoma do zika, de que o vírus tem proximidade genética com o vírus da encefalite japonesa. A doença causa inflamação cerebral e sua transmissão envolve mosquitos do gênero Culex. O dado poderá ser útil para que os cientistas entendam melhor a biologia da zika.
O trabalho no Rio, coordenado por pesquisadores do InstiEquipe inocula vírus em macacos e libera dados em tempo real. Um grupo internacional liderado pelo virologista americano David O`Connor, que conseguiu infectar macacos com o vírus zika, adotou uma prática incomum entre cientistas: em vez de publicar os resultados em revistas científicas, os pesquisadores estão liberando todos os dados em tempo real na internet.
De acordo com Renato Aguiar, do Instituto Adolfo Lutz, que faz parte do grupo, denominado Equipe de Ciência Experimental da Zika, a equipe já conseguiu infectar três primatas e pretende infectar macacas grávidas a fim de compreender os casos em que a infecção pode causar microcefalia.
“A ideia é acompanhar de perto como o vírus evolui e se desenvolve em um modelo animal”, disse Aguiar. Segundo ele, O`Connor, que estava no Brasil até ontem, percebeu a gravidade da epidemia de zika e decidiu abrir completamente os dados. “A revista Nature publicou um comentário, parabenizando essa iniciativa inovadora. Com as informações detalhadas divulgadas rapidamente, outros cientistas poderão planejar experimentos semelhantes”, afirmou. / F.C.
tuto Dde Pesquisa e Ensino (Idor) e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), visa a verificar se existe a relação entre o vírus e os problemas que estão sendo relatados. Para isso, é preciso antes de mais nada ter a confirmação da infecção, estabelecer a cronologia dos acontecimentos e investigar por imagens do cérebro o que de fato está acontecendo com essas pessoas.
“Não temos dados epidemiológicos, mas a impressão é que houve um aumento de relatos de encefalite e mielite nos últimos meses. São casos de acometimento da medula e do cérebro de adultos. Agente já vem trabalhando com a possibilidade de o zika causar problemas neurológicos que são reativos, que é o caso da síndrome de Guillain Barré (reação do sistema imunológico à infecção). Mas pode ser que gere também problemas diretos”, explica Fernanda Tovar Moll, diretora científica do Idor e professora da UFRJ.
Especialista em neuroimagem, ela está fazendo a análise de ressonâncias magnéticas desses pacientes. O objetivo, diz, é verificar as regiões do cérebro e da medula que possam ter sofrido alteração. “É como fazer um trabalho de cartografia das áreas mais acometidas.” Genoma. De acordo com Renato Aguiar, pesquisador do Instituto Adolfo Lutz que participou do sequenciamento, publicado na revista Lancet na semana passada, a descoberta poderá ajudar a investigar se o zika pode ser transmitido por outros vetores além do Aedes aegypti. “Por terem origens comuns, os dois vírus têm características biológicas comuns. Mas os vírus associados ao ramo da encefalite japonesa são transmitidos pelo Culex e não pelo Aedes. Como sabemos agora aposição filogenética do zika, podemos investigar pistas sobre seu comportamento e possíveis vetores”, afirma Aguiar.
Segundo Márcio Nunes, do Instituto Evandro Chagas, que também fez sequenciamentos completos do genoma do zika, o fato de o vírus da encefalite japonesa provocar alterações no sistema nervoso poderá ser útil para que os cientistas busquem marcadores biológicos de virulência – isto é, elementos que expliquem por que em alguns casos a infecção pode levar à microcefalia.
“No caso da encefalite japonesa, esses marcadores são muito bem descritos. Esse conhecimento prévio pode servir de base para que possamos buscar os marcadores no caso do zika.”
Fonte: O Estado de S.Paulo